quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

A historia da conquista do Dedo de Deus.

Datam do início do século XIX as primeiras manifestações montanhísticas do Brasil, havendo referências a uma inglesa que teria escalado o Pão de Açúcar (395 m), no Rio de Janeiro, em 1817. Em 1841 é registrada a presença do botânico inglês George Gardner na Pedra do Sino (2263 m), ponto culminante da Serra dos Órgãos.

A primeira escalada ao Pico das Agulhas Negras ou Itatiaiaçu (2787 m), em 1865, é atribuída a José Franklin da Silva. Em 1879 foi escalado o Pico do Marumbi ou Olimpo (1547 m), no Paraná, por um grupo liderado por Joaquim Olímpio de Miranda. Não se pode afirmar, contudo, que esses eventos tivessem qualquer conotação esportiva. O montanhismo como esporte no Brasil é bastante recente e, sem dúvida está intimamente ligado à conquista do Dedo-de-Deus (1675 m) por José Texeira Guimarães, o chefe da expedição, os irmãos Américo de Oliveira - Acácio, Alexandre e Raul Carneiro em 9 de abril de 1912. O Dedo-de-Deus, cujo contorno reproduz com nitidez uma mão apontando o indicador para o céu, é um dos vários monumentos geológicos da Serra dos Órgãos, região compreendida num setor da Serra do Mar - entre as cidades de Petrópolis e Teresópolis - e encontra-se nos limites do Parque Nacional da Serra dos Órgãos (PARNA-SO), criado pelo Decreto-Lei nº 1822, de 30.11.1939. A área do PARNA-SO é constituída, basicamente, de gnaisse arqueano, sendo alguns picos de granito.

Consta que no início deste século alguns alpinistas estrangeiros teriam tentado, sem êxito, escalar o Dedo-de-Deus, fato que chegou ao conhecimento do ferreiro pernambucano José Texeira Guimarães, radicado em Teresópolis. Lançada por Texeira a idéia da conquista, a ele juntaram-se Raul Carneiro e os irmãos Acácio, Alexandre e Américo Oliveira (foto acima), todos de Teresópolis.

Algumas incursões para reconhecimento do local teriam sido feitas pelo grupo, mas a investida que resultaria na conquista teve início na manhã de 6 de abril de 1912, sendo consumido um dia inteiro na caminhada de aproximação e montagem do acampamento-base. A chuva que caiu no dia seguinte não permitiu qualquer avanço. Na manhã do dia 8 são retomados os trabalhos e aí enfrentam o primeiro grande obstáculo: um paredão vertical de aproximadamente 12 m, com uma calha e fissura do lado direito. Ali são colocados, inicialmente 2 grampos de arganel. Com auxílio de um tronco amarrado aos grampos é vencido um lance e alcançado um pequeno platô; mais 2 grampos e o mesmo recurso do tronco, e o paredão superado. O lance que viria a seguir, com 3 m e igualmente vertical é vencido através de uma pirâmide humana, permitindo atingir a base de uma chaminé horizontal muito estreita, com 8 m de extensão, transposta com alguma dificuldade após a colocação de 4 grampos. Neste ponto é preciso enfrentar um lance externo e bastante exposto que exige a colocação de outros 3 grampos aos quais amarram o tronco; mais um obstáculo é vencido.

Não bastasse a persistente garoa, cai a tarde e começa a escurecer. Já não é mais possível prosseguir. Retornam então, à base do primeiro paredão onde, numa reentrância de pedra, se acomodam para passar a noite. Na manhã do dia 9 de abril reiniciam a escalada superando, um a um, todos os lances vencidos no dia anterior. Chegam, finalmente, a uma chaminé bastante estreita mas de pouca dificuldade ("Arranca-botão"). Outra chaminé vem a seguir, esta em forma de V, sendo cravados 3 grampos no primeiro trecho e mais 2 no segundo, permitindo alcançar um platô bastante amplo. Neste ponto já é possível antever a próxima chegada ao cume, mas o obstáculo agora é o paredão negativo de uns 4 m. Colocando um grampo na base e outro a 1,5 m, fixam a eles um tronco. Com auxílio de pirâmide humana, fazem subir Alexandre, o mais leve, o qual fixa o último grampo, possibilitando, assim, a subida de todo o grupo. Eram 17:00 do dia 9 de abril de 1912 e o Dedo-de-Deus fora finalmente conquistado!

Ao todo foram fixados 19 grampos de arganel (executados por Texeira), alguns dos quais ainda lá se encontravam. Após acender uma fogueira com objetivo de sinalizar para Teresópolis, os conquistadores improvisaram uma cobertura com ramagens e pernoitaram no cume.

Às 10:00 do dia 10 de abril, após hastearem uma bandeira nacional, os escaladores iniciaram a descida. Em Teresópolis foram recebidos como heróis e seu feito notificado com grande destaque pela imprensa. Feito notável para a época, principalmente se considerarmos que não tinham qualquer noção de técnica de escalada nem o equipamento de segurança de que hoje dispomos.

Consta que alguns conquistadores teriam voltado ao Dedo 2 anos após a conquista, mas naquela época não existiam associações de montanhismo e não se dispõe de qualquer registro desses eventos.

O Dedo-de-Deus possui hoje inúmeras vias de escalada além do Caminho Texeira (3º III Sup A-1C). A segunda via a ser conquistada foi a face Leste (3º III), em 1º de outubro de 1944, por Ulysses Braga, Almy Ulysséa e Antonio Augusto Taveira, do CEB. Trata-se de um feito notável, já que não foi colocado um só grampo em toda a extensão da escalada. Outras escaladas se seguiram: em 21 de julho de 1957, Drahomir Vrbas e Hamilton Maciel, do C.E. Carioca (CEC), conquistaram a Maria Cebola (III Sup), variante da Chaminé "Black-Out" da Face Leste. Em 29 de setembro de 1963, Claudio Vieira de Castro e Etzel Von Stockert, C.E. Rio de Janeiro (CERJ) conquistam a Face Sul (4º IV A-1). O diedro Salomith (4º IV A-1) é conquistado em 1982 por Amélio Montinelli, Mário Arnaud, Oswaldo Pereira (CEB/CERJ). Em 26 de maio de 88 é conquistada, na Face Norte, uma via de 200 m de extensão (6º VI Sup), sendo seus autores Cláudio V. Castro, Etzel Von Stockert, Mário Arnaud, Maurício Motta e Reinaldo Pires, do CERJ. Entre janeiro e julho de 1989, André Silva Ilha conquista - totalmente em nuts - três fissuras: Pseudo-Alpinista (IV Sup), com 40 m; Tempos Modernos (6º VII), com 85 m e Coração de Cristal (6º VII Sup), com a mesma extensão. Da primeira participou Marcos da Silveira e das duas outras, Ricardo de Moraes. Em 17 de março de 1991, André Ilha e Ricardo de Moraes conquistam a Passagem Abissal (5º VI Sup), uma horizontal com 70 m, toda em nuts, ligando - ao longo da Face Sul - as bases das vias Leste e Texeira.

Fontes: Mountain Voices - Informe Brasileiro de Montanhismo, ano II, nº 12, jul/ago 1992.
Teresópolis 203 anos de História 1788-1991, A. Osiris Rahal, 1991.

2 comentários:

André Dalastra disse...

Muito bom o Blog, muito legal mesmo.

Só uma ducida, vcs são de Jundiaí? pq eu sou, hehe.

Tenho um blog sobre campismo. Qdo puder da um volta lá.

campingtotal.blogspot.com

Abraços

André

André Zancanaro disse...

Positivo, todos moramos em Jundiaí tirando o Miltão que é guia de montanha na Cordilheira dos Andes. Vou visitar seu blog agora. Obrigado pelo elogio. Abração.